segunda-feira, 28 de julho de 2014

CASTANHOS COMO SOFREM...

O seu perfume chegava até mim muito facilmente, sua ansiedade gritava naquele silêncio. Fomos interrompidos com a música que tocava na rádio. Raul, nosso perfeito Raul, a nossa música de amor...
Aquele carro parecia muito pequeno para nós dois, eu queria dizer o quanto aquela música era especial para mim, e ele queria me dizer qualquer coisa que não fosse sobre o trabalho ou a escola.

Antes de ligar o carro, ele se virou e me encarou de um jeito estranho, seus olhos quase se confundiam com o escuro que ali estávamos, mas eu sabia perfeitamente que eram castanhos, como poderia me esquecer ? Mas ali, naquele momento, eram negros como a noite que nos rodeava.

Imaginei se ele também analisava a cor dos meus olhos, como ele definia: castanhos, verdes...
Mas não houve muito tempo, formou-se lágrimas pesadas em seus olhos, ele segurava com força cada uma que ameaçava cair. Sei que ele não estava tentando definir qual era a cor, e sim pensando em qualquer outra coisa que o deixava naquele estado.

Apavorei ao pensar que eu o tinha feito algo, dito algo infeliz, mas não lembro de nenhum argumento desse tipo. Há muito tempo eu já o tratava com um carinho diferente dos outros que eu tinha certeza que não o tratei mal em nenhum momento.

Eu aguardava pacientemente qualquer explicação, ele desviou seus olhos tão lentamente que pude perceber todos os cantos do carro que ele fitava. Ameaçou virar a chave e partir dali, mas eu segurei sua mão forçando-o a olhar para mim, enxuguei uma lágrima que escorreu pela sua face com a ponta do meu dedo enquanto sustentava um sorriso acolhedor em meu rosto.

- Vai ficar tudo bem!

Seus olhos brilharam ao ouvir essas palavras que saíram inconscientemente da minha boca. Eu nem sabia o porquê daquilo, ele tinha anos a mais do que eu, era ele quem devia me dizer essas coisas, ele que devia me acalmar em qualquer momento de sofrimento.... Mas naquele momento essas idades não faziam o menor sentido. Sabia que ele já vinha sofrendo com a perda há muito tempo...

Mas só naquele instante ele me confiou totalmente seus sentimentos, compartilhando suas dores com alguém que já passou pelo mesmo...

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